sexta-feira, 2 de julho de 2010

TRANSTORNOS INVASIVOS DO DESENVOLVIMENTO - T.I.D.

TRANSTORNOS INVASIVOS DO DESENVOLVIMENTO - T.I.D.
INTRODUÇÃO

Mônica de Castro e Costa Accioly
1. Breve histórico:O autismo foi identificado por Leo Kanner em 1943. Ele usou o substantivo autismo para descrever um grupo de crianças que tinham características comuns, sendo a mais notável a incapacidade de se relacionar com outras pessoas.
Para Frith, Kanner, pediatra e psiquiatra americano, ao descrever o quadro que denominou distúrbios autísticos inatos do contato afetivo, teve o mérito não só de identificar indivíduos com comportamento muito peculiares entre indivíduos com retardo mental e distúrbios do comportamento, como também separá-los do grupo dos esquizofrênicos. Sua descrição do autismo é tão precisa que ainda hoje é utilizada. Como reconhecimento ao seu trabalho, durante algum tempo o autismo foi chamado de síndrome de Kanner.
O autismo, é claro, não é um fenômeno moderno, embora tenha sido identificado neste século. Talvez o primeiro caso de autismo a ser registrado, de acordo com Frith (1989), tenha sido descrito pelo farmacêutico do hospital Bethlem, um asilo para doentes mentais em Londres. Um menino de cinco anos de idade que deu entrada em 1799 e que nunca brincou com as outras crianças, sempre sozinho, isolado com seus soldadinhos de brinquedo. Há ainda o relato de um médico francês, também no final do século dezoito, que descreveu detalhadamente o comportamento de Victor, um menino de doze anos, que foi encontrado vagando nos bosques de Ayeron.
Muitos psiquiatras, no final do século dezenove e início do século vinte, descreveram crianças com comportamentos que fugiam ao padrão de normalidade, referidas como psicóticas. Frith (1989) sugere que de acordo com os termos de Kanner, provavelmente eram autistas.
Quase simultaneamente a Kanner, em 1944, Hans Asperger, pediatra e psiquiatra austríaco, descreveu um grupo de adolescentes com falta de empatia com os demais, comunicação não-verbal pobre, atividades repetitivas, excelente memória mecânica, extravagante em seus relacionamentos sociais, reagentes a mudanças na rotina, com pobre compreensão de idéias abstratas. Apresentavam ainda movimentos corporais exóticos, desajeitados e pouco coordenados. Este autor enfatizava a inteligência preservada. Para Asperger, este grupo caracterizava-se por psicopatia autística

Kanner e Asperger publicaram descrições de casos e ofereceram teorias para explicar os comportamentos encontrados. Coincidentemente os dois pioneiros usaram o termo autistic para caracterizar a natureza do distúrbio. Na verdade, mais do que uma coincidência, este termo havia sido apresentado pelo psiquiatra Ernst Bleuler em 1911 e referia-se originalmente ao isolamento social encontrado em adultos esquizofrênicos.
Infelizmente, devido à Segunda Grande Guerra, o trabalho de Asperger não se tornou conhecido até 1979, quando Wing e Gould publicaram um estudo sobre ele.
Segundo Gauderer (1993), a partir, portanto, da descrição e definição de Kanner, nas décadas seguintes estas crianças foram descritas de maneira diferentes por autores diversos que se baseavam nas suas visões teórico-profissionais. Em 1947, Bender usou o termo esquizofrenia infantil ; Mahler, em 1952, utilizou o termo psicose simbiótica ; Renk, em 1949, falou de um desenvolvimento atípico do ego ; Bender, em 1956, referiu-se a pseudo-retardo ou deficiência ; em 1963 Ruther introduziu o termo psicose infantil ou psicose da criança ou psicose de início precoce.


2. Definição e caracterização atual

O diagnóstico do autismo foi incluído por Leo Kanner na literatura psiquiátrica há mais de cinqüenta anos. Desde então, milhares de estudos e pesquisas complementaram-se, compondo uma vasta literatura sobre o assunto. Entretanto, apenas recentemente os especialistas e pesquisadores de todo o mundo chegaram a um consenso no que se refere à natureza e ao critério de diagnóstico do autismo.
Em 1979, Wing e Gould, citados por Happé e Frith (1996), a partir do trabalho de Asperger, demonstraram através de um estudo epidemiológico que o autismo se tratava verdadeiramente de uma síndrome, caracterizada por uma tríade de sintomas, a tríade autista. Este estudo destacou que déficits na interação social, na comunicação e na imaginação estavam sempre presentes, não só nas crianças diagnosticadas com o autismo de Kanner, mas abrangiam também um maior número de crianças. Esta amplo espectro autista incluía, além das crianças mais gravemente afetadas (autismo de Kanner), aquelas que são socialmente mais ativas, apesar de bizarras (as descritas por Asperger).
Wing, citada em Bishop e Mogford (1993), afirma que a criança portadora da tríade é considerada estranha pelas demais pessoas porque, qualquer que seja seu nível de linguagem e de habilidades práticas, ela não responde de acordo com o padrão esperado.

A descrição da tríade lançou base para o diagnóstico estabelecido no Manual de Diagnóstico e Estatística da Associação Americana de Psiquiatria (DSM-III-R 1987), e trouxe a questão de que o prejuízo social no autismo poderia variar com a idade e diferentes habilidades.

Atualmente, considera-se que a perturbação social é um distúrbio do desenvolvimento e que suas diferentes manifestações fazem parte de um espectro de distúrbios relacionados, referidos como contínuo autístico. Seu alcance varia dos casos mais severos até aqueles pouco afetados, de difíceis (e mais tardios) diagnósticos. O distúrbio de Asperger passou a ser considerado como uma forma atenuada do autismo, embora alguns autores acreditem tratar-se de outra síndrome.

“O Autismo é uma síndrome definida por alterações presentes desde idades muito precoces e que se caracteriza, sempre, pela presença de desvios nas relações interpessoais, linguagem, comunicação, jogos e comportamento.” (Schwartzman, 1994)
A última edição do Manual de Diagnóstico DSM-IV (1994) inclui o distúrbio autista na categoria dos Transtornos Invasivos do Desenvolvimento (TID), cujas características são prejuízo qualitativo na interação social, na comunicação verbal e não verbal, nas atividades imaginativas e repertório extremamente restrito de atividades e interesses. São outras características a falta de flexibilidade do pensamento, falta de empatia, rigidez, perseveração e ansiedade aumentada.
A inteligência está afetada em muitos, mas não em todos os indivíduos e por isto o quociente de inteligência (QI) não é aspecto determinante do autismo.
De acordo com Rapin (1999), neurologista especializada em autismo, trata-se de um distúrbio neurológico e o critério para o diagnóstico é totalmente comportamental.

FONTE :
Bishop, D. and Mogford, K. Language Development in Exceptional Circunstances.
U.K.: Lawrence Erlbaum Associates, 1993.
Frith, U. Explaining the Enigma. London: Blackwell, 1989.
Gauderer, E. Autismo e Outros Atrasos do Desenvolvimento. Brasília:
Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência –
CORDE, 1993.
Happé, F. and Frith, U. The Neuropsychology of Autism. Oxford: Oxford
University Press, 1996; 119:1377-1400.
Rapin, I. Autism in search of a home in the brain. Neurology, 1999; 52: 902-904.
Schwartzman, J. Autismo Infantil. Brasilia: CORDE, 1994.

3. DSM IV (1994) – Transtornos Invasivos do Desenvolvimento (TID)
299.00 Transtorno Autista
299.80 Transtorno de Rett
299.10 Transtorno Desintegrativo da Infância
299.80 Transtorno de Asperger
299.90 Transtorno Invasivo do Desenvolvimento Sem Outra Especificação (PDD NOS)

4. Tríade Autista:
1. Prejuízos qualitativos na Interação Social
- contato visual; expressões faciais; relação com os pares; compartilhamento de satisfações; reciprocidade emocional.
2. Prejuízos qualitativos na Comunicação
- aquisição da linguagem; iniciação e manutenção de conversas; linguagem repetitiva e estereotipada; jogos sociais (faz-de-conta).
3. Padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades
- preocupação insistente em interesses restritos; resistência a mudanças na rotina;
estereotipia motora repetitiva; preocupação excessiva com partes de objetos.
EM RESUMO:
O AUTISMO é um transtorno neurológico .
Ainda não se conhecem suas causas .
O diagnóstico é feito com base no comportamento e não em exames .
A criança deve apresentar três aspectos essenciais, a “tríade autista” :

1° aspecto - Social – A criança pode ser desde passiva e isolada até “ativa mas excêntrica”. Tem dificuldade em estabelecer relações , interagir e para compreender as regras sociais.
  • não dá tchau ;
  • não olha nos olhos ;
  • não olha o que você olha ;
  • “avança” para os objetos ( ou comida ) das outras pessoas ;
  • abraça e beija pessoas estranhas ;
  • não atende quando é chamada ;
  • busca interesses só dela ;
  • não brinca com outra criança ;
  • só fala quando é de seu interesse ;
  • só fala sobre os assuntos que prefere ;
  • repete este assunto sem parar ;
  • não pergunta sobre a outra pessoa ;
  • sua fala tem uma entonação diferente , monótona ;
  • não sabe o que deve fazer numa situação nova , tem “ crises nervosas” ;
  • não sabe o que você pensa ;
  • não percebe se você está triste , zangado ou feliz ;
  • não demonstra as emoções como as outras pessoas ;
  • não percebe ironia na voz ou no rosto das pessoas.

2° aspecto – Comunicação e Linguagem – dificuldade ou impropriedade na comunicação. A criança pode não olhar nos olhos , não se comunicar nem mesmo por gestos e expressões faciais ou ainda apresentar postura corporal “estranha”. Algumas não tem nenhuma linguagem enquanto outras são muito falantes mas não sabem manter um diálogo verdadeiro .

  • não sabe pedir o que quer ;
  • não aponta ;
  • tem sempre a mesma expressão facial ;
  • usa a mão da outra pessoas como um instrumento ;
  • empurra a outra pessoa e olha o que quer ;
  • não sabe como abordar uma outra criança ;
  • grita muito ;
  • chora sem razão aparente ;
  • não atende quando é chamada ;
  • não entende o que você diz ;
  • parece não escutar ;
  • não sabe fazer perguntas ;
  • não responde ;
  • não compreende o “não” ;
  • quando faz perguntas , não entende a resposta e repete a pergunta muitas vezes ;
  • não entende quando você briga com ela , não entende as palavras , nem os gestos , nem a expressão do seu rosto ;
  • tem “crises de birra” ;
  • começa um assunto pelo meio ;
  • só fala sobre o assunto que interessa a ela.
3° aspecto – Imaginação – interesses restritos, resistência à mudança, dificuldade em brincar (“de faz-de-conta”) porque não percebem o objeto inteiro, mas só uma parte, um detalhe e não entendem para que serve o brinquedo. Apegam-se a objetos estranhos (linhas, canudos etc). A criança pode ainda ter rotinas rígidas , rituais .
  • não sabe para que servem os brinquedos , quebra ou atira longe ;
  • prefere objetos que girem, tenham luzes ou façam barulho ;
  • fixa-se em detalhes dos objetos ou brinquedos ;
  • não brinca com as outras crianças ;
  • prefere brincadeiras que envolvam o próprio corpo : cócegas , esconder, “pegar”;
  • prefere fazer sempre as mesmas coisas , da mesma forma , ir pelo mesmo caminho , sentar no mesmo lugar .
Obs: A criança não precisa apresentar todas as dificuldades citadas acima para ser autista. Foram citados alguns exemplos das dificuldades encontradas. O grau da dificuldade também varia muito. 

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