

ORIENTAÇÕES PARA MÉDICOS QUE ATENDEM PESSOAS COM SÍNDROME DE DOWN
Dra. Nanci Palmieri de Oliveira (Pediatra do Ambulatório da SD do HC/UFPR)
A Síndrome de Down é a alteração genética mais freqüente, ocorre numa incidência de um para cada oitocentos nascidos vivos, na proporção de 1,3 meninos para cada 1,0 meninas; é mais freqüente nas gestações de mulheres acima de 35 anos e paternidade de homens acima de 55 anos; tem a expectativa de vida em torno de 68 anos.
A Síndrome de Down ocorre por uma alteração cromossômica numérica, com a presença de um cromossomo 21 extra, por isso chamada de trissomia do cromossomo 21. Este excesso de material genético é responsável pelas características da Síndrome, tanto físicas com cognitivas.
A Síndrome de Down tem um fenótipo e pode ter 3 genótipos diferentes:
trissomia simples - ocorre em 95% dos casos, tem um cromossomo 21 extra.
translocação - ocorre em 3 a 4% dos casos, sendo que o cromossomo 21 extra está agregado ao cromossomo 14, 21 ou 22.
mosaicismo - ocorre em 1 a 2% dos casos, algumas células têm a trissomia do 21 e outras não, porque a trissomia ocorre após a primeira divisão celular do óvulo fertilizado.
Independente do genótipo encontrado, o fenótipo tem características muito semelhantes, tanto do ponto de vista clínico como cognitivo.
A Síndrome de Down pode cursar com alterações clínicas decorrentes de todos os aparelhos, com uma incidência maior que a população em geral.
Estas alterações não estão presentes necessariamente no período neonatal, mas podem surgir a qualquer momento, em diferentes fases da vida.
Assim sendo, as consultas devem ser realizadas como se fosse sempre a primeira consulta, sendo muito criteriosa, pois a cada momento podem surgir fatos novos.
CUIDADOS GERAIS:
Aleitamento materno:
Deve ser estimulado ao máximo para estabelecer e ampliar o vínculo mãe-filho. As características do leite materno contribuem para a prevenção de doenças infecciosas e a sucção trabalha toda musculatura orofacial durante as mamadas, levando a uma melhor postura da boca e da língua, melhora da fala e na coordenação da ingestão de outros alimentos.
Puericultura:
O lactente com Síndrome de Down deve receber os mesmos cuidados que a população em geral, salvo a indicação de chupeta ortodôntica, para melhorar a postura da língua e o tônus da musculatura orofacial. A vacinação deve ter o esquema regular adicionado das vacinas especiais (Pneumococo, Varicela, Meningococo tipo C, Gripe, Hepatite A). Orientações para alimentação devem ser feitas por fonoaudióloga, adequadas para a idade, quanto à postura, deglutição e mastigação, desde o nascimento.
Desenvolvimento Psicomotor:
Pode chegar próximo da população em geral quando a criança é amada no contexto social e familiar, a estimulação é iniciada o mais precoce possível, já no período neonatal, e o diagnóstico de patologias associadas é precoce e com intervenção adequada. Quando o Desenvolvimento Psicomotor não está correspondendo ao esperado para idade e para a Síndrome, devemos estar atentos para a possibilidade de rejeição, frustração ou de patologias associadas.
Dermatologia:
Existe uma tendência ao ressecamento da pele e o aparecimento de foliculites, furúnculos, intertrigo, etc. É freqüente também dermatite seborreica, dermatite atópica e lesões por fungos (unhas, pés e couro cabeludo). A alopecia areata e o vitiligo têm uma incidência maior na S.D. e tem relação com o estado emocional. A pele na S. de Down possui algumas características especiais que vão se estabelecendo já desde a infância. Ao nascer a pele é fina e suave tornando-se mais grossa e áspera principalmente nas regiões palmo-plantares.O envelhecimento precoce da pele e fotoenvelhecimento é freqüente sendo necessária foto proteção e hidratação desde a infância.
A dermatite atópica e estigmas atópicos (ceratose pilar) ocorrem com freqüência necessitando tratamento especializado. Devido ás alterações de imunidade celular e humoral da síndrome, estes pacientes apresentam com maior freqüência infecções fúngicas (monilíase oral e de pele, tinea da cabeça, onicomicose, tinea do corpo) e bacterianas (foliculite, piodermite) na pele.A alopécia areata e o vitiligo são frequentes e muitas vezes associados á outras doenças auto-imunes como hiper ou hipotireoidismo e doença celíaca, sendo necessária investigação endocrinológica e tratamento especializado. Muitas destas doenças auto-imunes podem piorar com o estresse emocional necessitando apoio integral do paciente e da família.A psoriase pode apresentar-se com quadros clínicos graves especialmente nestes pacientes, necessitando tratamento especializado.
Cardiologia:
A cardiopatia congênita ocorre em 45 - 50% das crianças e destas 45 - 50% vão para cirurgia cardíaca. A investigação deve ser no berçário e/ou o mais precoce possível, independente da presença de sopro cardíaco. A cardiopatia deve, sempre que possível, ser acompanhada periodicamente por cardiologista.
Endocrinologia:
A triagem neonatal para hipotirioidismo já detecta o quadro que ocorre em 1% dos RN com S.D. e o tratamento deve ser precoce para que não interfira no Desenvolvimento Psicomotor, que já é comprometido. As alterações endócrinas correm em 15 a 25% dos casos de S.D., sendo o hipotireoidismo e a obesidade os mais freqüentes. O controle da função tireoideana, através do T4 livre e TSH, deve ser realizado periodicamente, durante toda vida, pois pode interferir no desenvolvimento cognitivo e favorecer a obesidade. A tireoidite de Hashimoto e a diabetes também são mais freqüentes na S.D.
Gastroenterologia:
As patologias do aparelho digestivo acorrem em 12% dos casos e alguns já são diagnosticados intra-útero ou no período neonatal como: estenose hipertrófica de piloro, atresia de esôfago, megacolo congênito, membrana duodenal, etc. O RGE também é mais freqüente e mais prolongado. A pesquisa de anticorpos antiendomisio deve fazer parte dos exames de rotina, pois a doença celíaca é 10% mais freqüente que na população em geral.
Oftalmologia:
Alterações oftalmológicas ocorrem em 50% dos casos. No período neonatal deve ser feito a primeira avaliação pela incidência de catarata congênita em 3% dos casos e/ou a presença de nistagmo. Anualmente deve ser reavaliado pelo aparecimento dos distúrbios de refração (hipermetropia, miopia, astigmatismo) que aparecem em 45 - 50% dos pacientes.
Otorrinolaringológicas
Alterações otorrinolaringológicas ocorrem em 80% dos casos, devendo ser dada uma atenção especial para esta condição. Existe uma hipoplasia do terço médio da face o que leva a rinite, sinusites, otites de repetição, que devem ser tratados precocemente e por tempo prolongado. A redução de espaço, as infecções de repetição e a hipertrofia de amídalas e adenóide devem estar em constante avaliação, juntamente com a apnéia do sono que levam à indicação cirúrgica, para que não interfiram na audição e no desenvolvimento cognitivo. A avaliação auditiva deve ser precoce e periódica, iniciando no período neonatal e sendo repetida de acordo com o melhor método para cada idade, mesmo quando for inicialmente normal. A perda auditiva pode ser neurosensorial, condutiva ou ambas.
Hematológicas:
Hemograma com contagem de plaquetas deve fazer parte dos exames de rotina anual pela incidência de leucemia em 3% da população Down, podendo aparecer em qualquer idade. Policitemia, anemias, mielodisplasias transitórias também são mais freqüentes.
Imunológicas:
Na maioria das vezes a dosagem de imunoglobulinas é normal, mas a função das mesmas pode estar diminuída, favorecendo a quadros infecciosos. A ocorrência de doenças auto imunes é maior que na população em geral.
Aparelho respiratório:
As infecções do aparelho respiratório são muito freqüentes pela diminuição do movimento ciliar do trato respiratório, pela associação das cardiopatias, pela hipertensão pulmonar primária e pela diminuição da resposta imunológica O tratamento deve ser precoce e prolongado.
Ortopédicas:
Ocorrem em 15% dos casos. A frouxidão ligamentar e a hipotonia muscular contribuem para o aparecimento de problemas ortopédicos. A instabilidade atlanto-axial ocorre em 12% dos casos, pode ser sintomática ou não, devendo ser avaliada de rotina entre 2 e 3 anos de idade e posteriormente sempre que for iniciar atividades físicas ou procedimentos cirúrgicos que possam comprometer esta articulação. A instabilidade patelar, de ombro, alterações de quadril e dos pés devem também sempre ser avaliadas.
Neurológicas:
As alterações neurológicas ocorrem em 8% dos casos. Os transtornos convulsivos, o autismo e a Doença de Alzheimer são as mais freqüentes. O déficit de atenção e hiperatividade têm a mesma incidência que a população em geral.
Terapias:
A estimulação essencial, a fonoterapia e a fisioterapia devem iniciar o mais precocemente possível, preferencialmente já no período neonatal. As demais terapias devem ser adequadas a cada idade e a cada paciente individualmente.
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