domingo, 15 de novembro de 2009

O Processo de Romantização das Deficiências


Um olhar diferente sobre as deficiências

Comentário SACI: Artigo publicado na Revista Benjamin Constant de Dezembro de 2007
Ano 13 Número 38

Lucia Maria Filgueiras da Silva Monteiro

RESUMO

Este artigo tem por objetivo principal apontar e discutir algumas questões recentes no cotidiano de associações, escolas, universidades e ONGs, as quais, num processo chamado negação da deficiência, abordam assuntos específicos das pessoas deficientes, com uma visão romântica, distorcida e assistencialista, advinda de um paradigma (normalização) que não deixou saudades em termos de contribuição a esta causa. Volta-se a um período já vencido de uma luta árdua das pessoas deficientes pelo reconhecimento das deficiências como são, de suas necessidades e das reais possibilidades que se construíram em períodos nos quais o realismo somou e contribuiu para avanços, abrindo espaços antes impeditivos aos deficientes em diversos setores da sociedade.

Introdução

O termo comunidades tem hoje um aspecto abrangente no qual se inserem categorias que, em busca de direitos, tentam se fortalecer com a utilização do mesmo. A procura por garantias constitucionais específicas, além de espaços nos campos econômico (pensões e isenção de impostos), acadêmico (cotas), social e territorial (demarcação de terras) __ e por que não religioso? __ tem-se configurado como realidade na pós-modernidade. Alguns autores, como Bourdieu, Champagne, Morin, remetem esta questão ao processo de globalização, o qual detonaria a formação de guetos e de comunidades que lutariam por manter suas características étnicas e garantir benefícios sociais e culturais. Isto seria benéfico se fossem apenas estas as intenções daqueles que organizam, dirigem e mantêm estas comunidades. Todavia, os ganhos políticos e as intenções em termos de ganhos secundários (GOFFMAN, 1975) percebidos com práticas extremamente discriminatórias, cada vez mais ocupam espaço, e cada vez mais discriminam seres humanos, classificados de forma muito semelhante ao que em outras culturas recebe o nome de castas. Hoje, ser negro é ser afro-descendente, mesmo que sua negritude origine-se em outro continente que não o africano. Ser cego é ser deficiente visual, ser homossexual é pertencer à comunidade "gay". Aqueles que não aceitam estas terminologias passam a não mais pertencer a qualquer categoria amparada pelas entidades.

Nosso foco principal neste trabalho estará voltado para os "deficientes visuais" __ indivíduos cegos e de baixa visão __ que também vêm sofrendo o mesmo processo de categorização e, sobretudo, de um processo aqui denominado de romantização da deficiência e do que é ser cego. Quando apenas a teoria e pesquisas momentâneas e circunstanciais disseminam um saber baseado em uma rápida investigação de alguns meses, forma-se um falso pensamento sobre o grupo pesquisado e constrói-se um saber apartado da prática e do cotidiano. Torna-se importante ressaltar que o que foi dito não se refere à pesquisa como um mal, e sim, que a pesquisa bem feita agrega valor ao conhecimento e traz avanços ao campo de saber específico. O que se quer ressaltar aqui é o distanciamento, que nem sempre o pesquisador consegue ter, quando lida com um campo onde a alteridade interroga, faz pensar e afeta-o, como ser humano, antes de tudo. O encontro com a deficiência traz à tona sentimentos que merecem atenção para que a pesquisa não seja contaminada por suas questões internas, fazendo aflorar sentimentos que vamos denominar de "românticos". Como nos diz Goffman (1975, p. 23), "Quando normais e estigmatizados realmente se encontram na presença imediata uns dos outros, especialmente quando tentam manter uma conversação, ocorre uma das cenas fundamentais da sociologia ... o indivíduo estigmatizado pode descobrir que se sente inseguro em relação à maneira como os normais o identificarão e o receberão."

Percebe-se que tal fato não ocorre somente com o estigmatizado; os sentimentos do pesquisador ao aproximar-se de um campo novo, onde não há identificação imediata, tendo em vista o estigma, às vezes forma um pensamento eivado de falsas premissas e conclusões apressadas, advindas de alguns meses de estudo num campo onde há muitas diferenças a serem consideradas. A imersão no campo de pesquisa afeta, faz pensar, impele a reconsiderar conceitos, e isso é bom para ambos: pesquisador e pesquisado. Entretanto, o desconhecimento deste ato afetivo, muitas vezes, compromete seus resultados e conclusões.

Aproximação e Rejeição à Pesquisa, uma Atitude Motivada ou um Processo a Ser Construído?

Inicio este tópico revelando ao leitor deste artigo como surgiram os questionamentos acima descritos. Desde 2006 coordeno o Centro de Estudos do Instituto Benjamin Constant, IBCentro, coordenação da Divisão de Pesquisa Documentação e Informação deste centro de referência nacional para as questões da deficiência visual. Aproximei-me então de algo que jamais tinha chegado a meu conhecimento, mesmo trabalhando na Instituição há pelo menos vinte anos. O volume de pesquisas que utilizavam o Instituto Benjamin Constant (IBC) como campo era considerável, todavia a divulgação de seus resultados, aos profissionais, técnicos ou mesmo alunos do estabelecimento, raramente se efetivava, bem como os trabalhos acadêmicos, frutos das mesmas, também não eram entregues para fazerem parte do Acervo Bibliográfico Especializado. Algo previsto em legislação dos Comitês de Ética não era respeitado ou mesmo exigido pela Instituição. No IBC foram criados mecanismos de controle de pesquisa (ficha do pesquisador, termo de compromisso etc.), no entanto os mesmos não eram de todo respeitados. Algumas vezes, pesquisadores sequer preenchiam estes documentos e utilizavam o campo de pesquisa oficiosamente. Este quadro apontava para pelo menos duas situações que mereceriam análise por parte da Instituição: a facilidade com que esta acolhia o pesquisador, não exigindo dele a autorização para sua pesquisa (ato praticado, muitas vezes, até mesmo por funcionários da Instituição, que desconheciam as regras para pesquisa), e a banalização dos resultados obtidos, os quais se tornavam muitas vezes artigos científicos, livros ou mesmo um "certo tipo de senso comum" na área, ao serem levados para as comunidades de origem do pesquisador. Freqüentemente, os resultados lidos em outras comunidades científicas tornavam-se verdades sobre os deficientes visuais, mas não se sustentariam caso fossem analisados à luz da práxis e do conhecimento agregado pelos profissionais da Instituição ou de outras que tratassem do assunto.Esta situação levava os profissionais do IBC, em alguns casos, a rejeitarem novas pesquisas ou mesmo a não mais acreditarem que estas devessem continuar a ser permitidas, fato que fecharia um campo riquíssimo para o avanço das técnicas e de ações positivas para o grupo social enfocado. A análise destas e de outras situações vividas ao longo deste primeiro ano à frente da coordenação levou-me a uma estratégia de aproximação entre os pesquisadores e seu campo de pesquisa. Foram então agendadas palestras para que o corpo docente e técnico da casa pudesse ter contato com os pesquisadores, num espaço de troca e de diálogo entre a prática e a teoria, uma proposta que certamente passou a enriquecer ambos os grupos.

Ballet Clássico, Desenhos, Fotografias e Outras Práticas para Deficientes Visuais


Chegamos aqui ao cerne deste texto. A partir destes encontros, começou a surgir no IBC algo que nem mesmo eu suspeitara. Pesquisadores com algum trânsito na comunidade científica, doutores, pós-doutores, vindos de outras instituições, traziam os resultados de suas pesquisas para serem comentados na casa. Um espaço de reflexão foi criado e a discussão trouxe uma saudável aproximação entre o discurso acadêmico e o saber advindo do cotidiano vivido no IBC.

A vinda dos pesquisadores aos encontros científicos, trazendo os resultados de suas investigações, na verdade, iniciou-se bem antes da criação do IBCentro, com o envio de trabalhos acadêmicos (teses e dissertações) ao Acervo Bibliográfico Especializado e à revista científica da Instituição, Benjamin Constant (de cuja Comissão Editorial a autora deste texto participou). Nestes trabalhos, eventualmente, notava-se o que chamamos de viés romântico no trato com questões da deficiência visual.

O primeiro que irá ser comentado é o que trata do ensino do ballet clássico para este grupo. Aquele que tem algum conhecimento desta prática sabe, por experiência, que sua técnica é algo extremamente difícil, que exige observação visual constante do praticante para que este possa apreender detalhes, os quais são fundamentais para a sua execução e o aprimoramento inicial de suas técnicas. O tato infelizmente não é capaz de substituir a visão neste caso, pois os movimentos são de tal forma complexos que exigem para sua execução o caráter globalizador da visão, que apreende não só o movimento do corpo como um todo, bem como deste em relação ao espaço. O que se está dizendo não é fruto de simples observação e sim de uma tentativa de ensino desta técnica de dança (uma das muitas existentes) às alunas do IBC na década de oitenta. Nesta época, a autora deste artigo tentou experimentar o ensino de ballet clássico, uma vez que tomou conhecimento de que as alunas da Instituição haviam freqüentado aulas de dança sem fazer uso desta técnica, sob a coordenação da Prof. Yara Vaz¹ . Desta experiência resultou uma conclusão semelhante à da professora anterior: as meninas cegas poderiam, sim, dançar, mas o ballet clássico, em princípio, não era a técnica mais adequada a elas. Os porquês desta conclusão não caberiam neste texto, mas talvez um possa ser aqui descrito: o ballet clássico, por si só, é uma técnica onde o corpo está em permanente contração do tônus muscular, e esta rigidez é vista como condição para que os passos sejam executados. O corpo está sempre em estado de alerta para que força e equilíbrio se conjuguem no intuito de realizar os passos, mas esta contração muscular não deve ser perceptível ao observador, daí o caráter artístico agregado aos movimentos. Para esta execução o corpo está em tensão. Esta tensão permanente não seria, em princípio, benéfica ao corpo do cego, que pelas dificuldades de locomoção já se encontra em permanente estado de alerta, o que causa um tônus já por demais retesado. Esta tonicidade acontece por ter que caminhar sem poder ver o caminho e seu corpo se encontra nesta espécie de "alerta". Percebeu-se que as práticas mais adequadas seriam aquelas que trariam certo "relaxamento" ao corpo. O que decididamente não é o caso do ballet clássico. Foi talvez por isso que a professora Yara Vaz tenha optado por práticas de ginástica natural e a autora deste artigo, por práticas de dança moderna, contemporânea e uma aproximação com a ginástica rítmica.

Levando em conta esta experiência, sentimo-nos à vontade para analisar, de forma colaborativa, outras que elejam o ensino de ballet clássico para meninas cegas. Não se está aqui querendo traçar limites para qualquer prática, apenas há que se considerar que algumas nem sempre beneficiam seus praticantes. Nada impede que seja oferecida esta modalidade de dança. Em alguns casos, pode-se dizer que é possível a prática desta técnica, mas mesmo para pessoas que enxergam ela é extremamente elitista; são necessárias facilidades em termos de flexibilidade, equilíbrio e controle muscular. Portanto é uma prática extremamente difícil de ser executada, mesmo por pessoas que enxergam. É nesse ponto que, mesmo percebendo como são importantes iniciativas inovadoras, alertamos para a adequação das mesmas, evitando um certo romantismo associado a determinadas práticas. É importante que se divulgue que essas são tentativas de incluir o deficiente visual, mas que ele tem que ser informado que nem sempre executa as técnicas como as pessoas que enxergam. Ele precisa ter consciência de suas limitações, para que também não forme uma falsa idéia sobre si mesmo. Não esclarecer esse ponto seria criar uma condição na qual a cegueira seria vista como um "poder" e que, apesar dela, o cego poderia "dançar na ponta do pé". O importante é perceber que validade tem para o outro, que significado para ele tem esta prática e até mesmo que prejuízos pode causar-lhe², entre outras considerações. Todavia caberá sempre ao indivíduo a escolha.

Passemos a outra questão: o ensino de desenhos para cegos. Este é um tema que abre diversas discussões. A primeira delas é o significado que o desenho tem para a criança deficiente visual, já que esta não se beneficiaria da visão de seu próprio desenho. Outras questões surgem, tais como a imposição do desejo do vidente em ver o cego fazer algo que não fazia parte de seu cotidiano até então. O desenho tem características bidimensionais que não podem ser apreciadas pelo tato. Hatwel (2003) trata destas e de outras situações em seu trabalho, quando estuda a compreensão de desenhos, por pessoas cegas, através do tato.

Um outro ponto merece consideração e um amadurecimento com respeito a essas representações gráficas. Quando um cego desenha um rio como sendo um círculo com pedrinhas no seu interior, ele está expressando a sua representação desta experiência tátil. É dessa maneira que para ele o rio se reveste de forma. Nós que enxergamos tenderíamos a identificar esta forma como um lago. Temos pois que cuidar para não impormos nossa representação, advinda do sentido da visão sobre o tato, uma clara ocorrência do paradigma visuocêntrico. A criança cega pode e deve ser informada de que um rio não é redondo, mas que ela pode assim representá-lo, pois é a sua visão do rio. Cabe ao professor informar e esclarecer como os videntes percebem o rio, até porque, mais tarde, nas aulas de Geografia, a criança perceberá que o rio percorre vários caminhos e que não se limita a um círculo. Como pensar sobre esta questão? Existem dois aspectos: o primeiro seria a interferência na criatividade da criança quando se expressa; o segundo, a imposição de uma representação advinda do olhar sobre uma interpretação advinda do tato. Para o cego, que desenhou um rio como sendo um círculo, estava claro que esta era a sua "visão" daquele espaço, percebida através de seu tato e representada por ele corretamente.


Neste ponto, pode-se questionar se a informação do professor não seria uma interferência da percepção visual sobre a tátil. Por outro lado, sabemos que as pessoas cegas perguntam sobre a forma de objetos que não podem tatear integralmente. Sob este aspecto, a descrição tem lugar, mas não como limitadora da expressão artística da criança.

A questão dos desenhos para deficientes visuais merece ser investigada mais profundamente, pois ela é citada em alguns textos como apropriada para este grupo. Em MEC (2001, p.162) encontramos a seguinte citação: "A criança deficiente visual também necessita expressar seus sentimentos, pensamentos e fantasias através do desenho."

A discussão sobre imposições de padrões dos videntes sobre os deficientes visuais fez-nos pensar sobre uma outra questão: a fotografia. Desta feita, avançamos significativamente em nossas elucubrações, quando nos lembramos do comentário de uma professora sobre seu aluno. O menino perguntou sobre suas possibilidades de fotografar. Ela, pensando sobre o assunto, questionou-se: "O que direi a meu aluno quando este me perguntar: Já que o cego pode tirar fotografias, também poderá dirigir automóvel?"

A pergunta levantava a discussão sobre as reais possibilidades da pessoa cega. Bavcar (2001, p. 25) provoca-nos falando que: "a fotografia é sua maneira de perverter o método de percepção estabelecido entre as pessoas que enxergam e as pessoas cegas."

A fotografia e o desenho não poderiam ser vistos pelo deficiente visual e atenderiam apenas ao desejo daqueles que enxergam sobre aqueles que não podem ver. Então qual seria o sentido destas práticas para os deficientes visuais? Seria então uma romantização da deficiência? Uma negação da mesma? Passemos a esta questão.

Uma Questão Filosófica: A Percepção do Desejo dos que Vêem na Tentativa de Aproximar os Cegos da Visão

O que estamos chamando aqui de romantização das deficiências é um certo modo de fazer com que o deficiente aproxime-se o mais possível de práticas que pessoas sem deficiência possam desempenhar. Seria um retorno ao paradigma de normalização, vigente há décadas atrás, um retrocesso a um período onde o deficiente tinha que parecer o mais "normal" possível. Seria uma forma velada de negação da deficiência, pois se práticas que são eminentemente visuais podem ser realizadas por pessoas cegas, quais então são as limitações da cegueira? O que seria importante saber: é tão relevante para o cego realizar desenhos que não pode ver? Tirar fotos que, da mesma forma, não pode apreciar? Analisando a questão de forma contrária, ou seja, do ponto de vista do indivíduo "vidente": será que por saber braille teríamos que lê-lo com a ponta dos dedos? Estas aproximações são, a nosso ver, formas realmente românticas de se observarem os impedimentos de todos os seres humanos para a realização de determinadas tarefas. Todavia a discussão remonta aos escritos de Diderot ao referir-se à recuperação da visão.

Recentemente a fotografia foi alvo de discussão e curiosidade a partir do pensamento do filósofo esloveno Evgen Bavcar. Ele perdeu a visão por volta dos dez anos e encara a fotografia como modo de apropriação de imagens e de expressão, segundo uma ótica perpassada pela filosofia. Mas nem mesmo ele descarta que para fotografar necessita da ajuda de pessoas que enxergam. Então a função de fotógrafo é limitada. Está claramente definido aí até quanto ele é incapaz para esta função. Lembremo-nos ainda que Bavcar não é cego congênito e menciona a lembrança de imagens com as quais conviveu. Em visita ao Instituto Benjamin Constant em 2001, estes e outros questionamentos foram feitos ao filósofo por deficientes visuais presentes ao encontro. Foi perguntado o porquê de Bavcar intitular-se fotógrafo cego, e não apenas fotógrafo. Quando usa a denominação "fotógrafo cego", onde estaria o destaque, na fotografia ou na cegueira? Na potência como artista plástico ou na deficiência do fotógrafo cego?

Existem diversas práticas onde o deficiente visual notabiliza-se por sua competência e excelência. Em muitas delas supera as pessoas que enxergam, em função de seus canais perceptivos estarem voltados para a tarefa sem a dispersão causada pela visão. Parece-nos, no mínimo, romântica e, por que não dizer, quixotesca a realização de tarefas possíveis sim, mas onde o foco está voltado não para o valor do realizado e sim para o feito extraordinário envolto na deficiência!

Mais uma vez lembramos, ao encerrar este artigo, que não se está aqui apontando limites para o ser humano, no caso, aquele que não vê, mas sim tentando abrir uma discussão sobre o que se está percebendo como um retorno ao paradigma de normalização, o qual fixou suas metas na aproximação dos deficientes de pessoas ditas "normais", desconsiderando o que a sociedade necessitava fazer para dar condições àqueles de nela viver. O intuito do artigo é abrir espaços para a reflexão dessas questões e de fomentar pesquisas que revelem a adequação, ou não, de determinadas práticas eleitas para os deficientes visuais.

Conclusão

Espera-se que, após a leitura deste texto, outros profissionais dialoguem acerca do que foi dito. Que surjam novas discussões e respostas ao que ora foi exposto, e que se possa futuramente obter conclusões sobre estas e outras questões, advindas de pesquisas e estudos nos quais os pesquisadores tratem a deficiência de forma realista. Sobretudo, que elejam seu universo de sujeitos contemplando-os na pesquisa de forma participativa e não somente como pessoas a serem observadas. Pesquisas que interroguem este grupo social acerca de suas preferências, de suas aspirações, bem como de suas impossibilidades e limites. Espera-se ainda que as instituições voltadas para estas questões abram cada vez mais centros de pesquisa para que, à luz da ciência, possa-se avançar nos estudos e, de forma dialética, desmistificar algumas falsas premissas divulgadas sobre os deficientes, no caso aqui, pessoas cegas ou com baixa visão. A ampliação do campo para pesquisas nesta área necessita do aporte teórico e prático das instituições e de seus técnicos, para que no futuro não haja uma apropriação indevida da imagem e das possibilidades deste grupo. Ainda hoje, as representações sociais da cegueira estão relacionadas à invalidez e aos impedimentos, mas certamente não será através da colocação do indivíduo cego em pé de igualdade com os videntes na realização de determinadas tarefas que esta representação mudará. Observar o impedimento como limite é algo que a todos afeta, pois quem não os tem? Então propomos uma questão para reflexão dos leitores desta publicação técnico-científica: ao lerem este artigo, interroguem-se sobre suas próprias impossibilidades e limites e imaginem-se num ambiente onde sejam forçados a atuarem desconsiderando-os. Será esta a melhor forma de se conviver com as diferenças?

NOTAS DE RODAPÉ

1Yara Vaz: Conhecida professora de Educação Física que foi funcionária do IBC na década de sessenta.
2 Sabemos que certas patologias oculares, tais como o glaucoma, carecem de cuidados específicos como evitar colisões, quedas ou movimentos bruscos que podem causar piora do quadro patológico.


REFERÊNCIAS


BAVCAR, Evgen. A Luz e o cego, Benjamin Constant, Rio de Janeiro, v. 7, n. 19, 2001.
BOURDIEU, Pierre; CHAMPAGNE, Patrick . Os excluídos do interior. In: NOGUEIRA, M. A.; CATANI, A. (Orgs.). Escritos de Educação. Petrópolis: Vozes, 1998.
HATWEL, I. Psychologie cognitive de lac cecité précoce. Paris: Dunot, 2003.
GOFFMAN, Erving. Estigma – Notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: Zahar, 1975.
MEC, SEESP. Programa de capacitação de recursos Humanos do ensino Fundamental – Deficiência Visual, v. 1, Brasília, 2001.
MORIN, Edgar. O método 5 __ a humanidade da humanidade: a identidade humana, Tradução de Juremir Machado da Silva, Porto Alegre: Sulina, 2005.

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