quarta-feira, 4 de agosto de 2010

O uso de materiais flexibilizados em sala de aula

O uso de materiais flexibilizados em sala de aula


Além de acessíveis, novos recursos tornam as atividades mais atraentes para a classe inteira

Daniela Talamoni Verotti (novaescola@atleitor.com.br)
Foto: Léo Drumond
CONTATO ALTERNATIVO Matheus se comunica com os colegas e as professoras por meio da prancha de comunicação. Foto: Léo Drumond
Vai bem longe o tempo em que a voz, o quadro-negro e o giz eram as únicas ferramentas de trabalho do professor. Imagens, objetos, jogos, livros, filmes, músicas, tudo o que possa ser usado a favor da aprendizagem é bem-vindo e ganha importância ainda maior nos novos tempos da escola inclusiva. Afinal, além de proporcionar as aulas mais estimulantes, diversificar recursos é uma maneira de torná-las também mais acessíveis a todas as crianças - tenham elas deficiência ou não.

Essa prática foi adotada pela EE Pedro Fernandes da Silva Júnior, em Ribeirão das Neves, a 32 quilômetros de Belo Horizonte. Lá estuda Matheus Henrique Reis Alves. O garoto teve paralisia cerebral e, como consequência, comprometimento severo dos quatro membros e do sistema fonoarticulatório. Hoje, aos 8 anos, cursa o 3º ano da escola regular e está sendo alfabetizado. Com a ajuda de recursos flexibilizados, ele desenha, lê, interpreta textos, resolve as operações matemáticas, participa das atividades em sala e se comunica, além de escrever no computador.

O que garante a interação de Matheus é uma prancha de comunicação. Ele movimenta o pé direito e usa uma sapatilha adaptada, com suporte para lápis. "Isso permite que ele desenhe, pinte e participe das atividades", explica a pedagoga Vânia Loureiro, da equipe de reabilitação infantil do Hospital Sarah Belo Horizonte, que desenvolveu os equipamentos.
A prancha é um cartaz em que são colocadas figuras e imagens que representam pessoas da família e da escola, lugares frequentados, atividades de lazer ou tarefas básicas, como escovar os dentes, ir ao banheiro, dormir e beber água. Quando quer dizer algo, ele aponta com o pé a figura correspondente.

Na escola, a prancha de comunicação de Matheus ganhou letras e números e os professores a usam para checar se ele entendeu o conteúdo. "Para uma atividade de leitura, a professora de apoio prepara respostas para as perguntas sobre a história que será contada", explica Eleuza de Fátima Neiva, titular da turma. "Quando apresento as questões que são discutidas oralmente, ele aponta a resposta na prancha." Rosemary de Lima Ferreira Mendes, professora de apoio, foi buscar orientação com a equipe do Sarah na hora de elaborar as pranchas. "Já temos algumas com o vocabulário cotidiano da sala, com o alfabeto, com números e com atividades de múltipla escolha, além da que foi construída originalmente."

Matheus agora testa um programa de comunicação alternativa no computador. O software, doado pelo hospital, lança letras na tela e o menino clica, com o pé, num dispositivo adaptado à cadeira quando surge a que quer usar. Assim cria suas primeiras palavras. "Ele já escreve o próprio nome e algumas expressões simples", comemora Rosemary. "No futuro, essa ferramenta vai ser muito importante na vida dele."

Astronomia visual 
Na EE Amyntas de Barros, em Pinhais, na região metropolitana de Curitiba, o desafio da professora de Ciências Joseane Maria Rachid Martins era ensinar alunos com deficiência auditiva. Ela pesquisou para enriquecer o conteúdo das matérias de 5ª e 6ª série com fotos, desenhos e vídeos. "A ideia é estimular e fixar a memória visual dos estudantes com deficiência auditiva e, de quebra, facilitar o entendimento de toda a turma", explica. "Utilizo muito mais imagens do que textos nas minhas explicações."

Joseane começou a f lexibilizar aproveitando a TV com acesso a pen drive disponível na escola para ampliar as possibilidades de exibição de vídeos, áudios, imagens e animações. Também recorre a apresentações teatrais, desenhos esquemáticos no quadro-negro e materiais para ensinar noções de astronomia e, especialmente, o sistema solar.

Para as classes de 5ª série, por exemplo, ela mostrou filmes com imagens da Terra, da Lua, do Sol e dos planetas e ainda fez uma encenação com o globo terrestre e alguns alunos para explicar os movimentos de rotação e translação. Como atividade para retomar o conteúdo aprendido, Joseane sugeriu a criação de uma revista de passatempo com caça-palavras.

Nas avaliações, a professora usa exatamente as mesmas ilustrações apresentadas em sala. Os testes dos alunos com deficiência trazem as mesmas perguntas formuladas aos ouvintes, mas com diferenças na elaboração: sempre com mais figuras, esquemas e desenhos, além de questões de múltipla escolha. Quando têm de fazer dissertações, os alunos respondem em Libras, com a ajuda da intérprete.

Recursos a favor do surdo-cego 
Para quem nunca teve uma experiência de inclusão na sala de aula, ensinar uma criança com deficiência múltipla pode parecer uma tarefa impossível. Na Escola Classe 214 Sul, no Distrito Federal, a professora Gracielle Souza Silva assumiu esse desafio, como guia-intérprete do aluno Iury Moraes Eminergídio, 15 anos, que cursa o 6º ano.

Iury nasceu com catarata congênita e deficiência auditiva causadas por uma infecção por citomegalovírus. Entre as sequelas, o garoto tem dificuldade de locomoção e de orientação no espaço. Ao longo dos anos, perdeu totalmente a visão no olho esquerdo e enxerga muito pouco com o direito. Gracielle tira as dúvidas e facilita a comunicação de Iury com o professor de cada disciplina e os outros alunos. Ele sabe Libras e braile e adora ler. Com alguns recursos diferenciados, consegue manter sua paixão pelos livros e foi homenageado pela equipe da escola por ser o aluno que mais frequenta a biblioteca.

Em casa, Iury usa uma lupa eletrônica que amplia o texto numa tela. Como esse recurso não está disponível na sala de aula, a professora Gracielle providencia a digitação prévia dos textos que serão trabalhados em aula. Ela usa letras em tamanho 26 e em negrito, com espaço duplo. "Quando o computador não está disponível, copio os textos a mão mesmo", conta.

Fatima Ali Abdalah Abdel Cader Nascimento, coordenadora do Núcleo de Atendimento ao Surdo-Cego da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal, diz que os textos devem sempre ser reescritos na íntegra. "Não há redução de conteúdo ou troca de léxicos, justamente para incentivar a ampliação do vocabulário", afirma. "Gracielle é uma tutora que, por meio de repetição do conteúdo em Libras, ampliação de material escrito e exemplos concretos, garante que o aluno realmente aprenda."

Xeque-mate na exclusão 
Na sala de recursos da EEEM Senador Salgado Filho, em Alvorada, a 30 quilômetros de Porto Alegre, a professora Fátima Rosane Dias Azambuja atende no contraturno vários alunos das escolas de Ensino Fundamental da região. Num dos projetos, o Vemos com as Mãos, é usado o jogo de xadrez para trabalhar gráficos com alunos com deficiência visual. "Encontrei no tabuleiro do xadrez - formado por letras e números - uma forma de explicar tais conceitos."

O jogo foi adaptado, com as casas brancas rebaixadas no tabuleiro e peças diferenciadas (lisas ou ásperas). E as oficinas que vieram em seguida ensinaram mais do que Matemática. "Reis, damas, peões e cavalos e o próprio objetivo do jogo, que é atravessar o tabuleiro para capturar o rei, têm motivado crianças da 3ª e da 4ª série a criar fábulas e histórias", conta.

Com a ajuda da técnica de papietagem (a colagem de papéis sobre moldes gigantes), foram construídas peças de xadrez de 1 metro de altura para serem manipuladas por todos os alunos durante o recreio. Para isso, o chão da escola virou um tabuleiro. O projeto fez tanto sucesso que ganhou patrocínio. O instituto de um grande banco equipou a sala de recursos com máquinas de braile e computadores.

Prancheta estratégica
Foto: Alexis Prappas
ÂNGULOS EM BRAILE O professor Santos adaptou transferidor e prancheta para ensinar Matemática a Lucas. Foto: Alexis Prappas
O desafio de ensinar um aluno com deficiência visual também inspirou o professor de Matemática Haroldo Mendes dos Santos a criar recursos diferenciados para o 9º ano do Colégio Papillon Park, em Aparecida de Goiânia, cidade vizinha à capital goiana. A intenção era ensinar cálculo de ângulos para Lucas Ferreira Rosa Souza Oliveira, 15 anos, que é cego.

As flexibilizações começaram em 2007, quando Lucas levou para a sala uma antiga prancheta especial em que desenhava. Ao ver o equipamento, Santos vislumbrou uma série de usos para possibilitar o aprendizado de certas questões matemáticas. Com a prancheta, ele ensinou o trinômio do quadrado perfeito e as razões trigonométricas. "Quando preciso ensinar equações com números e letras ou símbolos, recorro à prancheta", explica Santos. "Também preparo antes atividades com cola em alto-relevo."

Numa dessas atividades, o professor - que domina o braile - adaptou um transferidor para que Lucas pudesse medir os ângulos. Além da prancha, o jovem conta com uma máquina de braile cedida pela prefeitura, com o apoio do Centro de Apoio Pedagógico, que oferece reforço no contraturno.
Quer saber mais?
CONTATOS 
Colégio Papillon Park, Av. J2, quadra 27, lotes 20 a 28, 74900-000, Aparecida de Goiânia, GO, tel. (62) 3594-6355
EE Amyntas de Barros, R. Salgado Filho, 1371, 83324-010, Pinhais, PR, tel. (41) 3669-6017
EEEM Senador Salgado Filho, R. Alberto Pascoalini, 99, 94820-001, Alvorada, RS, tel. (51) 3483-3490
EE Pedro Fernandes da Silva Júnior, R. Principal, 135, 33921-005, Ribeirão das Neves, MG, tel. (31) 3638-4082
Escola Classe 214 Sul, SQS 212, área especial, 70293-000, Brasília, DF, tel. (61) 3901-2502

INTERNET 
Neste site, você encontra os endereços em todo o Brasil do Hospital Sarah, especializado em reabilitação

Um comentário:

Não fuja da raia disse...

Caro Ms.Sergio, soube de ti atraves de uma profªEF de SC Dóris e tb sou prof° e estou estudando AEE, tenho necessidades pois resido no interior Bahiano em Medeiros Neto, Não temps recurso algum e gostaria de saber como adquirir materias para melhorias das aulas e do rendimentos de meus alunos com problemas motor.Grato foi um grande prazer.