segunda-feira, 10 de junho de 2013

Ele superou seus limites nadando


Paratleta começou ainda criança a exercer sua paixão pelas piscinas e hoje acumula medalhas e viaja o mundo representando o Brasil em competições
Luana Nogueira
Da Reportagem Local
Daniel Carvalho
O jeito tímido do paratleta Caíque Aimoré Domingues Fernandes, de 20 anos, fica ofuscado pelas dezenas de medalhas que ostenta no peito. A paixão pela piscina começou cedo e, hoje, as raias brasileiras se tornaram pequenas para o nadador que percorre o mundo, com recursos próprios, em busca de mais títulos. Ao lado da mãe, Denise Domingues, procurou vencer a timidez ao ser entrevistado na academia onde treina durante a semana. A mãe complementava as informações fornecidas pelo tricampeão brasileiro de natação da Associação Brasileira de Desportos de Deficientes Intelectuais (Abdem). Ele é portador de mosaicismo, Síndrome de Down em grau leve.
Dentro das piscinas, ele precisa superar os atletas de ponta e isso ele tem tirado de letra, mas o maior desafio do paratleta é vivido fora da água. O nadador não tem patrocínio e compete com o próprio dinheiro. A ajuda e a força para que o jovem continue a competir vêm da mãe e do irmão Caiubi, além da equipe técnica.

A carreira de vitórias de Fernandes começou a ser trilhada em 2010 e hoje ele acumula dezenas de medalhas e títulos, tanto no Brasil quanto no exterior. Sua principal vitória foi na Itália, onde arrematou sete medalhas de ouro no 6° Campeonato Mundial, promovido pela Organização Internacional de Natação para Portadores da Síndrome de Down (sigla em inglês DSISO). Além disso, ele acumula 19 medalhas no Circuito Loterias Caixa e quatro medalhas de ouro no Campeonato Europeu 2011.

Mogi News: Você sempre morou em Mogi?
Caíque Aimoré Domingues Fernandes: 
Nasci em Mogi, na Vila Rubens, e atualmente moro no Socorro. Estudei a maior parte da vida na Escola Estadual Professor Camilo Faustino de Mello, mas já tinha frequentado a Escola Municipal Coronel Almeida. Comecei a nadar com 6 anos, mas gostava muito de futebol, sou fanático até hoje, mas, depois, parei e fiquei mais na natação. Comecei a nadar no Clube Náutico, fiquei bastante tempo, depois, passei a nadar em uma academia no bairro Mogilar. Eu parei de jogar futebol para poder me dedicar mais à natação.


MN: Quais foram seus principais incentivadores?
Fernandes:
 A professora Lurdinha (Maria de Lourdes Rocha) me incentivou. Conheço a professora desde que eu nasci e gosto muito dela. Ela sempre me acompanhava nas competições da região e me incentivou na profissionalização. O professor (Tsuneo) Ikeda passou a me treinar em 2010, com o preparador físico Marcelo Cursino.


MN: Quando você começou a disputar campeonatos?
Fernandes: 
Comecei a competir com 10 anos e os campeonatos ocorriam na região. Dos 10 aos 15 anos, participava de competições regionais, no Alto Tietê. Depois dos 16 anos, passou a ser algo mais profissional. A primeira competição que ganhei foi em Suzano. Lembro-me que foi muito legal ganhar dos meus amigos e receber vários elogios.

MN: A partir de quando passou a competir profissionalmente?
Fernandes: 
Comecei a me profissionalizar em 2010, mas tive de me integrar a uma equipe de São Paulo, da Associação Paradesportiva JR Ferraz, onde tem minha categoria. Mogi não tem esta categoria, por isso, não posso representar a cidade, mas represento o Brasil. Nas competições regionais, não tem minha categoria que é o S14, e Síndrome de Down. A primeira competição que ganhei fora do Alto Tietê foi em Maringá (PR), em 2010, depois em Porto Alegre (RS), Fortaleza (CE), Equador, Portugal e Itália, que foi o campeonato mundial, onde ganhei sete medalhas de ouro. Agora, em 2014, voltarei para o Mundial, com recursos próprios.

MN: Quando percebeu que a natação poderia virar uma profissão?
Caíque: 
Foi quando eu consegui ganhar na região, só que eu nadava com os regulares, não tinha uma classe para mim. Eu consegui ficar em terceiro lugar como melhor atleta do ano e foi quando minha família viu que eu gostava mesmo de nadar. Minha mãe começou a pesquisar sobre o Paraolímpico e viu que eu tinha uma grande chance. A primeira competição foi em 2010, para ver o que ia dar. Tive consciência de que ia ser puxado. Acabei amadurecendo e descobri que tinha a chance de ser um nadador, que não era mais um hobby, era profissional.


MN: Em que momento descobriu que poderia disputar o Mundial?
Caíque: 
Foi em Portugal, porque, até então, o único campeonato que havia disputado fora do Brasil tinha sido no Equador, mas não existiam países de primeiro mundo competindo. Os atletas em Portugal eram mais fortes, essa foi uma prévia. Este ano, o campeonato ocorrerá novamente em Portugal, mas acredito que não vou participar para poder conseguir ir ao Mundial no México em 2014.

MN: De quais outras competições você participa?
Caíque: 
Tem o Circuito Lotéricas Caixa, que nado na categoria S14. São as mais difíceis, porque não tem a minha categoria específica e tenho de dar tudo de mim para conseguir uma colocação, mas tenho conseguido estar entre os melhores. Essa competição tem três etapas, a próxima será em junho, em Porto Alegre, e a outra depois de dois meses, em Fortaleza. Este circuito é reconhecido pelo Comitê Paraolímpico e é uma boa competição. Estou treinando muito para os campeonatos e eu estou ansioso para competir no circuito da Caixa.


MN: Qual foi a competição mais difícil que disputou?
Caíque: 
Acho que foi na Itália, achei a mais emocionante. Foi muito difícil, principalmente ganhar do nadador do Japão, mas estava confiante. A Itália foi muito legal, a cidade é muito bonita e pude conhecer muitos lugares, como o Coliseu. Eu também vi o papa de perto pelo telão, fiz muitas coisas legais na Itália.


MN: Como é a sua rotina de treinamento?
Caíque: 
Eu nado quatro vezes por semana. Meus treinos acontecem segunda, terça, quarta e quinta-feira. Faço os exercícios todos os dias, são quatro dias de natação e três dias de exercício. Faço vários exercícios fora da água para dar mais preparo. Chego a treinar cerca de duas horas por dia, são treinamentos pesados. Faço aquecimento e depois treino muito. Gosto de tudo na natação, as conquistas, a alegria de ganhar, de ter uma equipe e de ver os companheiros na mesma batalha. É uma grande satisfação. Durante o período da competição, todo mundo é igual. Cresci muito e adquiri o respeito das pessoas.

MN: Você pensa em disputar a Paraolimpíada?
Caíque: 
A Paraolimpíada é um problema muito sério, porque não tem a minha categoria. Ela tem o S14, mas esta categoria engloba todos os intelectuais, até mesmo aqueles que têm algum distúrbio que não os compromete fisicamente. Preciso ter um índice para a Paraolimpíada no S14, mas não existe a minha categoria específica, que é Síndrome de Down. Poderia até participar no S14, mas não consigo este índice, pois esta categoria é praticamente para pessoas que não têm deficiência nenhuma. As competições mundiais têm a categoria de Síndrome de Down e são reconhecidas pela DSISO (sigla em inglês de Organização Internacional de Natação para Portadores da Síndrome de Down), já o comitê Paraolímpico não reconhece. Existe uma conversa para incluir esta categoria nas Paraolimpíadas e ficamos na esperança. Com as medalhas que ganhei, tinha esperança de o Brasil reconhecer que a categoria deveria ser incluída na Paraolimpíada. O comitê chegou a ler o projeto, mas desistiu.

MN: O que acha do incentivo à natação em Mogi?
Caíque:
 Falta incentivo. Se eu tivesse patrocínio, conseguiria participar de mais competições. Quem sabe eu consigo.

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