Casamento + filhos com Autismo = Separação?
Não é segredo para ninguém que, na sociedade moderna, os relacionamentos têm durado cada vez menos, tendo se tornado quase que descartáveis ou com prazo de duração pré-estabelecido. A vida a dois é difícil e requer bastante atenção e cuidados por parte do casal. Não somente o Amor, mas também o respeito é peça chave e fundamental para toda e qualquer relação, seja amorosa, entre amigos ou até mesmo no âmbito profissional. O dia a dia agitado, com mil tarefas a ser desempenhadas, principalmente por parte da mulher, que é esposa, mãe e profissional, torna esta missão por vezes quase que IMPOSSÍVEL. A grande verdade é que homens e mulheres encaram o nascimento de seus filhos de formas distintas, até mesmo por questões culturais e biológicas, nas quais a própria natureza se encarrega de oferecer aos pais certas limitações. Quando recebemos aquele “papelzinho” escrito POSITIVO, que significa a confirmação da gravidez, nossa vida muda instantaneamente. Nos sentimos “a Mãe” e pobre daquele que ousar não notar a nossa “barriga” (ainda inexistente mas que juramos de pés juntos existir!). Nos tornamos mães antes mesmo de nossas crias virem ao mundo. Durante 9 meses gestamos nossos bebês, conversamos com eles e sentimos passo a passo as mudanças que acontecem em nossos corpos e acompanhamos o verdadeiro milagre da vida acontecendo em nossos ventres. Deixamos de ser somente filhas para nos tornarmos Mães. Deixamos de ser somente protegidas e passamos também a proteger. E como NUNCA, passamos a entender melhor nossas mães…E os homens? Estes ainda não se tornaram efetivamente pais. Acompanham como meros telespectadores a revolução que está em andamento. Alguns acompanham bem de perto (chegam até a enjoar!) enquanto outros assistem passivos, sem saber o que fazer, com medo de interferir e macular aquele momento único, entre mãe e filho, momento este em que parece não haver espaço para a presença de mais ninguém. Que fique bem claro que aqui NÃO vai nenhuma crítica aos pais! De forma alguma!!! Em minha opinião, o homem se torna pai quando o bebê nasce. Mas como se dá este processo no dia a dia? Conheço homens que trocam fraldas, assumem muitos dos cuidados com o bebê e são exímios na arte de colocar seus filhotes para dormir, mas a Natureza (que também é Mãe) se encarrega, caprichosamente, de nos tornar responsáveis pela alimentação de nossos filhos, alijando mais uma vez o homem deste processo. É milenar o fato de que homens e mulheres têm papéis totalmente diferentes no processo de criação dos filhos. Entretanto, é justamente por este motivo que a coisa funciona. O que, naturalmente, NÃO impede que somente um dos dois possa assumir esta criação sozinho (em caso de separação) e de obter êxito e sucesso neste processo. O instinto maternal e quase animal (afinal , qual é a mãe que não se transforma numa verdadeira leoa para defender seus filhos?) faz com que muitas mulheres tenham a tendência de super proteger seus filhos, esquecendo-se que a superproteção desprotege e cria seres frágeis e inseguros, incapazes de enfrentar as mínimas adversidades que a vida, porventura, vier a lhe proporcionar. Homens são geralmente mais “durões” com os filhos, chamando-os à razão para as cobranças da vida, de forma providencial. Um complementa o outro. Os papéis de ambos compõem uma verdadeira peça de encaixe e ambos precisam estar em plena sintonia para que este processo seja bem sucedido. Quando o bebê nasce é natural que nós, mulheres, voltemos nossas atenções para eles. Alguns maridos relatam que se sentem abandonados neste momento. É uma nova fase que não perdura muito tempo e que requer a adaptação do casal. Rapidamente o bebê irá crescer e as coisas entrarão novamente os eixos. É mais ou menos desta forma que acontece o funcionamento de uma família com uma criança neurotípica. E quando nos deparamos com um filho com necessidades especiais? Especificamente autismo, em nosso caso? Estas são crianças que levam um tempo MUITO maior para crescer. Demandam uma atenção e vigília constante e se torna obrigatório que sejamos a legítima “mulher-polvo”, com vários braços, além de necessitarmos de, pelo menos, uma dúzia de olhos (que por mais que sejam, serão sempre insuficientes!) Trocando experiências com outras mães cheguei a conclusão de que ter uma criança autista em casa pode ser comparado a ter quase que eternamente o stress e a preocupação que temos quando eles são recém nascidos. São e sempre serão, por mais que cresçam e evoluam – e é fato que trabalhamos e nos dedicamos com afinco para que isto aconteça – nossos eternos meninos e meninas. Demandam uma atenção extremamente maior e em tempo integral do que as crianças neurotípicas. O cansaço que sentimos, muitas vezes, beira à exaustão física e mental. E como ele se repete diariamente, tornando-se um ciclo ininterrupto, nos tornamos extremamente sensíveis a tudo e a todos… Emoção à flor da pele, literalmente. Muitas de nós abdicam de seus empregos para se dedicar aos filhos autistas. Da mesma forma, abrimos mão de nossas atividades de lazer. O tempo que anteriormente era gasto conosco, por exemplo, ora trabalhando, ora fazendo compras, lanchando com amigas ou viajando com nossos cônjuges é empregado quase que totalmente à nossas crianças, tarefa que, embora seja realizada com amor e carinho enormes, pode desprender até 10 horas diárias de nossa atenção. Exaustas física e emocionalmente, queremos ser ouvidas e cuidadas por nossos companheiros e partilhar com eles nossos anseios, dúvidas e esperanças a respeito dos filhos. Queremos também que eles nos ajudem nas atividades relacionadas às crianças, dividindo assim um pouco desta tarefa árdua. Mas nossos parceiros também estão esgotados da luta diária e nem sempre prontos ou aptos a nos ouvir. Ou por vezes, simplesmente, não sabem como nos ouvir e nos ajudar, pois encontram-se tão ou mais inseguros do que nós. Frequentemente, é possível observar que alguns cônjuges procuram culpa uns nos outros (“ele é autista porque deve ter puxado alguém da sua família!!!”), como se houvesse um vilão responsável pela condição do filho e como se elegendo um culpado a situação se resolvesse e o Autismo simplesmente desaparecesse de suas vidas! Muitas vezes, os relacionamentos não suportam e sucumbem à esta verdadeira tsunami de emoções, sensações e sentimentos.
Desde que entrei nesta “montanha-russa” emocional do Autismo, tomei conhecimento de que é amplamente divulgado que a porcentagem de divórcio entre os casais com filhos autistas chega a quase 80%. Sempre aceitei este índice como sendo verdadeiro, pois é muito comum encontrarmos pais e mães de autistas divorciados. Desta forma, temos um conceito (equivocado) de que casais com filhos com TEA estão, praticamente, condenados à separação. Entretanto, quando optei por abordar deste tema, pesquisei a respeito e notei que esta é mais uma lenda urbana acerca do Autismo.
Uma pesquisa conduzida em Maio de 2010 pelo Dr. Brian Freedman, do Kennedy Krieger Institute, apontou para o fato de que o índice de separações entre casais com filhos autistas (64%) é praticamente o mesmo índice que observamos entre os casais com filhos neurotípicos (65%). Apesar destas novas evidências, isto NÃO significa de forma alguma que a vida de casais com filhos com TEA seja mais tranquila. Alguns estudos trazem achados bastante interessantes; já se sabe que os pais de crianças autistas apresentam níveis mais elevados de stress do que os pais de crianças com Síndrome de Down e com outras condições psiquiátricas, por exemplo. Por outro lado , também é possível encontrar casais que relatam que seus relacionamentos saíram fortalecidos desta experiência, pois precisaram se unir ainda mais e se descobriram companheiros e parceiros, não somente marido e mulher, pai e mãe. Não há como contestar que o Autismo, bem como os desdobramentos que ele nos traz, pode influenciar negativamente o casamento, pois cuidar de uma criança com TEA influencia todos os aspectos da vida familiar e a relação marital não escapa deste impacto.
Portanto, é vital que marido e mulher se unam neste momento, evitando cobranças e críticas um ao outro, pois estas atitudes não resolvem a questão e só agregam ainda mais amargura e sofrimento a este processo. Buscar grupos de apoio é uma ideia bastante válida, pois a troca de experiências com outros pais que vivem a mesma situação com seus filhos costuma ser reconfortante e positiva. A divisão de tarefas entre ambos, que devem se alternar ( na medida do possível ) nos cuidados com o filho e na tomada de decisões, é fundamental para que um dos dois não fique sobrecarregado física e emocionalmente. E se ainda assim a separação for inevitável, deve-se manter em mente que, mesmo separados, os pais devem unir-se pelo filho, mantendo a divisão das tarefas parentais para que através da educação partilhada, o objetivo maior seja alcançado: o bem estar, a felicidade e o desenvolvimento desta criança. Afinal, existem ex marido e ex mulher, mas filho é para SEMPRE.
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