terça-feira, 17 de dezembro de 2013

'É inviável', diz mãe de criança com Down sobre possível fim de APAEs


Uberlandense se sente ameaçada por Plano Nacional de Educação.
Projeto será votado nesta terça (17) em Brasília e pode 'obrigar' inclusão.

Fernanda ResendeDo G1 Triângulo Mineiro
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Mãe e filha estão juntas contra a inclusão forçada (Foto: Andrea Zapparoli/Arquivo Pessoal)Mãe e filha estão juntas contra a inclusão forçada
(Foto: Andrea Zapparoli/Arquivo Pessoal)
Mudar a proposta do Plano Nacional de Educação (PNE) e universalizar o ensino dos alunos com deficiência. Esse é o intuito do projeto aprovado na Câmara dos Deputados e que irá para votação no Senado na próxima terça-feira (17). A ideia inicial era de extinguir a educação das Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apaes) de todo o Brasil e fazer a migração desses estudantes, preferencialmente, para a rede pública. O projeto causou comoção nacional e, emUberlândia , não foi diferente. A aceitação, não aconteceu.
Andrea Zapparoli é mãe de uma criança com Síndrome de Down. A pequena Ana Carolina tem quase três anos de idade, estuda na Apae de Uberlândia e é lá que recebe assistência social e educacional. Ao saber que os deputados propuseran cortar repasses do governo às Apaes depois de 2016, Andrea não conseguiu conter a indignação. “É ridículo e inviável. Não que as crianças não tenham condições de frequentar um ensino regular, mas o Brasil, a educação, os professores e nem mesmo os alunos estão preparado para essa mudança”, disse.
Há a necessidade da escolha, pois se não a sociedade acaba voltando à ditadura"
Andrea Zapparoli, mãe de criança com down
A mãe de Ana Carolina considera o projeto como mera politicagem. “É bonito falar de inclusão, mas a ideia não abrange as próprias crianças, estas que teriam que ser ‘obrigadas’ a estarem em uma sala com mais de 30 alunos. Não tem jeito, não tem a menor chance de dar certo. Isso é injusto para os dois lados”, afirmou.

Andrea Zapparoli acredita que há a necessidade da escolha, pois se não a sociedade acaba voltando à ditadura. Os pais, segundo ela, têm que ter a opção de decidir qual o melhor lugar para os filhos.
Votação pode afetar Apaes
Diretora diz que a luta ainda não terminou (Foto: Aparecida do Carmo/Arquivo Pessoal)Diretora diz que a luta ainda não terminou
(Foto: Aparecida do Carmo/Arquivo Pessoal)
Segundo a diretora pedagógica da Apae de Uberlândia, Aparecida do Carmo Santos, caso haja a votação favorável às mudanças do Plano Nacional de Educação, sem nenhuma alteração, as associações serão  afetadas, inclusive a de Uberlândia. Atualmente, segundo ela, 341 alunos, desde a primeira infância à fase adulta, são atendidos pela Apae de Uberlândia.
Ela explicou que a Federação das Apaes, em toda sua história, defendeu e lutou para garantir a inclusão da pessoa com deficiência intelectual e múltipla, não só na escola, mas também em outros espaços na sociedade. “Entendemos e defendemos a escola especial para um público específico, que devido aos comprometimentos da deficiência intelectual e múltipla não terão os apoios necessários permanentes e contínuos de que necessitam em uma escola da rede pública”, afirmou.
De acordo com a diretora, a Federação Nacional das Apaes conclama o movimento apaeano brasileiro, suas 2.116 filiadas a assumirem uma postura de defesa da educação especial, a lutar para a garantia do reconhecimento, do funcionamento e do financiamento para que as escolas especiais possam cumprir seu papel, favorecendo e permitindo um aprendizado constante, durante toda a vida. “A luta ainda não terminou e precisamos garantir a coexistência no sistema educacional brasileiro das escolas especiais e das escolas comuns inclusivas”, ressaltou Aparecida do Carmo.
Possível acordo
G1 conversou com o senador Eduardo Barbosa (PMDB-AM), membro do Conselho Consultivo das Apaes de Minas Gerais. Segundo ele, tudo indica que o senado chegará a um acordo sobre a proposta. “Dois relatórios foram apresentados com alterações no projeto inicial. Tanto um quanto o outro assegura o atendimento de crianças e jovens em escolas inclusivas e também em instituições especializadas de ensino”, explicou.
Eduardo Barbosa garantiu que com qualquer uma das duas aprovações os alunos não terão suas matrículas negadas e os pais poderão fazer a opção da escola que melhor atenderá seus filhos. “Com esse texto/aprovação morre a preocupação da sociedade quando se fala em extinção das Apaes”, concluiu.
A última sessão para tratar do assunto aconteceu na semana passada. Durante a leitura do relatório do Plano Nacional de Educação em Plenário, o senador afirmou que a meta 4, que trata da educação inclusiva, foi uma das áreas mais debatidas e negociadas.
Na ocasião, segundo consta no site do Senado, ao ser questionado pelo senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) sobre o repasse de recursos às Apaes, Eduardo Barbosa respondeu que o governo vai honrar os compromissos assumidos. “ As Apaes não serão excluídas. Teremos contraturnos com matrículas e teremos repasses do Fundeb para que tenhamos, ou pela parte da manhã ou na parte da tarde, os contraturnos nas Apaes”, afirmou o líder do governo.
Inclusão, mas com preparação
Gislene é professora de artes na rede pública (Foto: Gislene Silva/Arquivo Pessoal)Gislene é professora de artes na rede pública
(Foto: Gislene Silva/Arquivo Pessoal)
A escola e seus profissionais ainda não estão preparados para receberem alunos especiais. Esse é o posicionamento da professora de Uberlândia Gislene Silva, que atua no Ensino Fundamental do 1º ao 5º ano. Ela já teve experiências com esse público e disse que essa inclusão ainda é mascarada. “Na verdade é uma inclusão que acaba não se efetivando por vários aspectos: falta de adequação do espaço físico, de material didático e pedagógico para atender esses alunos”, disse.
Gislene contou que já teve uma aluna no 1º ano que era autista e que conseguiu perceber uma evolução, mas que poderia ter sido maior caso o ensino fosse diferenciado. “A criança tinha relatório médico e era agressiva. Ela mordia, cuspia, beliscava muito as outras crianças e qualquer servidor que se aproximasse dela. Houve uma pequena evolução, pouca, mas houve e foi só o que observei durante este ano”, garantiu.
Segundo a professora, antes de se aprovar um projeto como esse é necessário capacitar primeiro os professores, oferecer melhores condições de trabalho e materiais pedagógicos e didáticos apropriados. “Devemos sim incluir essas crianças, mas temos que recebê-las adequadamente e saber lidar com a situação das deficiências de cada uma delas. Aos poucos esses alunos estão adentrando na escola regular, mas a maioria dos profissionais não está sabendo como lidar com essa nova situação”, finalizou.

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