Mara Gabrilli na coluna 20P da revista Playboy
Mara Gabrilli é a entrevistada da coluna 20P da revista Playboy de Dezembro. A deputada federal fala sobre o acidente que a colocou numa cadeira de rodas, sexo, viagens de ácido, política, o caso Celso Daniel e as possibilidades de se tornar presidente do Brasil
1. O que de pior passou pela sua cabeça depois do acidente de carro que a fez ficar tetraplégica?
Os primeiros medos, que eram os mais assustadores, foram os de me tornar uma pessoa totalmente dependente dos meus pais e de não poder mais fazer sexo. Por isso rolou sexo já na UTI. Eu estava com esse medo, e aí resolvi testar, né? (Risos)
2. Foi uma boa surpresa?
Foi uma ótima surpresa! Existe uma crença de que, quando se sofre um acidente desses, seu “organismo” desliga e fica assim pra sempre. Então, quando vi que eu teria sensações diferentes, que eu ficava lubrificada, aquilo me deu um puta alívio. Tudo que sinto no meu corpo, sinto de outro jeito. São outros nervos que me trazem informação. É curioso. O orgasmo antes do acidente era um gráfico assim (faz com a cabeça um movimento de sobe e desce), e agora fica assim, só no topo…
3. Uow! É melhor, então?
É diferente. A intensidade muda. Muda o tesão, a sensibilidade na pele, a sensibilidade por dentro. Mas essa intensidade é subjetiva. Não está ligada à condição física. Ela vem de outra forma. Minha libido aumentou porque me sinto muito mais madura. Olha, agora não estou namorando, mas estava até outro dia, e ficava diariamente pensando em sexo.
4. Como é a vida de solteira de uma cadeirante? Como são as abordagens?
Acho que já rola de cara uma boa seleção. É mais difícil para os homens. Eles ficam rodeando, tentando entender o que tá rolando…
5. Depois de quase 20 anos do seu acidente, você ainda sonhar em voltar a andar?
Não tenha dúvida. Faço exercícios de segunda a segunda para manter meu corpo pronto. Quero correr uma maratona. (Risos)
6. Você acha que a evolução da medicina pode ajudar?
Atualmente, existe muita coisa de neuroprótese, de implantar chip etc. No caso de uma lesão medular, isso está mais próximo da gente do que a questão das células-tronco embrionárias. Pô, a gente tá falando de célula criada in vitro, numa clínica de fertilização, e que os óvulos inviáveis (para a fertilização) serão congelados e provavelmente irão para o lixo um dia! Ficar brigando para que isso não aconteça? Se você for tão contra, é só não usar. É como o cara que é Testemunha de Jeová e não faz transfusão de sangue. Ele não faz e a gente respeita, mas você vai impedir o avanço da humanidade por causa de crenças muitas vezes ignorantes?
7. No livro Depois Daquele Dia, você relata algumas experiências com drogas antes do acidente. Como as drogas entraram na sua vida?
Quando eu tinha uns 20 e poucos anos, era uma coisa bem normal. Você chegava a uma festa e alguém acendia um baseado. Eu fazia duas faculdades e morava com minha avó. Fumava ao lado dela e ela nem notava. (Risos) Era tudo muito propício. Mas imagina hoje? Fumar um baseado e ir para o plenário? Acho que não ia rolar. E cocaína, eu me lembro das primeiras vezes que cheirei… Me dava prazer, queria mais. Mas, em determinado momento, vivi uma má experiência com um namorado, que usava muito. Parei para salvá-lo, e acabei salvando, também, a mim mesma.
8. Como ficou sua relação com as drogas depois disso?
Continuei usando um baseadinho, assim, de vez em quando. Mas uma vez (já tetraplégica) tomei um ácido e meu corpo começou a tremer dos pés à cabeça. O corpo ficou tenso, todo reto, e eu parava em pé na piscina! Foi o máximo, porque praticamente conseguia levantar o braço. Supergostoso. Mas depois a viagem não passava. Meu coração ficou acelerado e comecei a ficar com medo de ter um treco. Hoje só tomo vinho.
9. E fica bêbada?
Na cadeira de rodas é mais elegante, né? Você não perde a compostura, não sai por aí trançando as pernas. E outra: você sabe que vai sair carregada de qualquer jeito. (Risos) Falando sério, não fico bêbada, não. Comecei a tomar vinho por conta do frio que sentia. Quando estou com muito frio, é um elixir.
10. Antes do acidente, passava pela sua cabeça entrar para a política?
Nem antes nem depois. Eu achava que não tinha perfil. E que política era a coisa mais chata do mundo. Daí minha mãe começou a insistir: “Você seria bem votada, e tudo que você faz pela sua ONG (Projeto Próximo Passo) e pelo instituto (Mara Gabrilli), você conseguiria fazer muito mais!” Então comecei a refletir que eu já fazia política. Quando se é militante, presidente de ONG, você tende a procurar um culpado, e para mim o culpado sempre foi o governo. Só que, quando assumi a Secretaria da Pessoa com Deficiência, me vi dentro do governo. Foi a questão mais complexa que tive de administrar. Ficava pensando: “E agora, quem é que vou xingar?”
11. Você sofreu preconceito no Congresso por ser cadeirante?
As pessoas sempre olham. Mas não encaro isso como preconceito. Eu mesma olho. Se não me segurar, vou lá e pergunto: “Ei, por que você está numa cadeira de rodas?” Acho que, como vereadora de São Paulo, na Câmara Municipal, sofria muito mais preconceito por ser mulher do que por ser uma pessoa com deficiência.
12. Como acontecia?
Eles, os vereadores, não tinham muita disponibilidade. Depois fui entender todo o percurso, o porquê de eles não gostarem de ouvir. Não era só porque eu era mulher. Não gostavam de ouvir porque não queriam mudar o estado das coisas.
13. Essas atitudes fazem parte do “ranço de mesquinharia” de que você fala no livro?
Muitos vereadores ficam prestando atenção no que você vai fazer para não deixar que você faça. Isso é o fim do mundo! E isso pode acontecer dentro da sua própria bancada. É como se você concorresse com cada vereador. Tem muita gente ali olhando para o próprio umbigo.
14. Já faz quase dez anos que você está na política. Rola muita corrupção?
Dá para saber que rola, mas nunca ninguém teve a coragem de me fazer uma proposta indecorosa. Os vereadores iam ao meu gabinete, falavam, falavam… E não falavam nada. Acho que iam para sondar. Mas esse negócio de ver dólar rolando, nunca vi.
15. Sua família era dona de empresa de ônibus no ABC paulista (SP) e foi diretamente envolvida no caso Celso Daniel, prefeito de Santo André assassinado em 2002. (Luiz Alberto Gabrilli, pai de Mara, disse que era obrigado a pagar propina para que sua companhia pudesse funcionar.) Qual é a sua expectativa sobre a conclusão desse caso?
Essa é uma dívida que a gente tem com o país. Todos os réus foram julgados, mas falta julgar o mandante, que é o Sérgio (Gomes da Silva) Sombra. Eu procurei o ministro (do STF) Marco Aurelio (Mello), que é relator do processo. Cabe a ele o começo do julgamento. Não estou pedindo para condenar, e sim para julgar.
16. Foi por causa dessa história toda que você decidiu se filiar ao PSDB?
Foi pelo (José) Serra. Eu o conheci porque era amiga da filha dele (Verônica Serra). Mas, por causa disso tudo, eu já não gostava do PT de jeito nenhum.
17. O que você acha da disputa entre ele e o Aécio Neves pela candidatura presidencial em 2014?
Admiro o Serra, acho-o muito competente. O Aécio, conheço menos, mas simpatizo com ele. É um cara inteligente, sério, que tem possibilidades de ser um bom presidente. Mas quem sou eu para preferir um ou outro? Deixa os dois se digladiarem. (Risos) Só acho que ambos têm de se respeitar mutuamente. E ambos têm o direito de sair pelo Brasil, de trabalhar, de fazer, de acontecer.
18. E você, já está pensando em 2014?
Minha vida é uma campanha permanente. Trabalho o dia inteiro para as coisas melhorarem. E, olha, posso publicar tudo o que faço, prestar conta para as pessoas… Aparentemente, vou me candidatar a deputada federal, mas aceito novas sugestões e ideias. (Risos)
19. Aceitaria disputar um cargo executivo?
No momento não penso em cargo executivo. Mas vamos ver o que acontece. Gosto de mudar.
20. O Brasil está pronto para ter uma presidente cadeirante?
Olha, o Brasil não está preparado para o cadeirante. O país precisa ficar muito melhor para todos eles, independentemente do cargo. Mas sei que eu estou pronta! (Risos)
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