sábado, 15 de agosto de 2015

Exemplos que valem ouro


Investimento desde a base e aprimoramento das comissões técnicas ajudam a explicar o sucesso dos para-atletas brasileiros em Toronto, muito superior aos sem deficiência

Raul Montenegro (raul.montenegro@istoe.com.br)
Se mantiverem a performance das últimas competições, os para-atletas brasileiros de várias modalidades devem garantir seu lugar no pódio no Rio de Janeiro, ano que vem. Esses esportistas brilharam no Parapan-Americano e conquistaram o primeiro lugar na competição, à frente das potências esportivas Estados Unidos e Canadá, superando o desempenho dos atletas tradicionais do País, que ficaram em terceiro no torneio que acabou em julho. Até a tarde de sexta-feira 14, eles contavam 88 medalhas de ouro (os sem deficiência contabilizaram 41). O Parapan de Toronto, que termina no sábado 15, não é um ponto fora da curva na história paralímpica nacional. A atuação do Brasil em todos os jogos para deficientes é excelente. Nos três últimos Parapan, por exemplo, os brasileiros acumularam dois primeiros lugares e 244 medalhas de ouro, quase o dobro das conquistadas nos Pan. Neles, sem a participação dos atletas com deficiência, ficamos, no máximo, no terceiro degrau mais alto do pódio no saldo final das competições recentes. Mas se o esporte paralímpico recebe menos investimentos que o tradicional, como explicar essa diferença de rendimento?
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SUPERAÇÃO
André Brasil, destaque brasileiro na natação, ouro na prova dos 100m borboleta
De acordo com o presidente do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), Andrew Parsons, os para-atletas conseguem fazer mais com menos. O dirigente não compara o desempenho dos esportistas deficientes com os tradicionais, mas diz que potências como Estados Unidos e Canadá colocam, só na elite paralímpica, quantias maiores do que a CPB dispõe para financiar desde a base até a ponta dos esportistas brasileiros com deficiência. “Conseguimos bons resultados apesar de nossos investimento e estrutura serem inferiores aos desses países”, afirma Parsons. Por aqui, hoje em dia a lei Agnelo/Piva, de 2001, destina 2% da arrecadação das loterias da Caixa ao esporte nacional. Destes, 85% vão para o comitê olímpico tradicional e apenas 15% para os deficientes. Juntando essa quantia aos patrocínios e outros apoios, foram R$ 82 milhões no ano passado para o comitê paralímpico. A partir de janeiro de 2016, a porcentagem da arrecadação das loterias passa para 2,7% e a partilha muda: 62,96% ao esporte sem deficiência e 37,05% aos para-atletas. Com isso, a receita deve ficar em cerca de R$ 90 milhões, avalia o presidente da CPB.
Um das chaves do sucesso é que o trabalho começa a partir da base. Desde os anos 1980, o Brasil vem colocando o esporte paralímpico em escolas, estratégia que há muito tempo é vista como a receita das nações de sucesso. “Nas modalidades sem deficiência temos ainda a ideia do esporte no clube, enquanto nas com deficiência há o conceito da inclusão”, diz Patrícia Silvestre de Freitas, especialista em educação física adaptada e professora da Universidade Federal de Uberlândia. No esporte olímpico, o estímulo às crianças não foi colocado em prática nem depois da escolha do Rio de Janeiro como sede dos Jogos de 2016. No paralímpico é diferente. “Nós seguimos um planejamento de longo prazo, revemos nossas ações para ver se elas estão surtindo efeito e corrigimos os rumos quando não é o caso”, afirma Parsons.
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Outro fator fundamental para os bons resultados foi o aprimoramento da formação de técnicos e assistentes, como médicos e fisioterapeutas. Acabou a era do voluntariado, quando as pessoas ajudavam sem receber, e começou o período da profissionalização. “Existe uma proximidade do desenvolvimento dos treinamentos com as universidades. A parceria entre ciência e prática vem sendo produtiva”, diz Luís Gustavo Pena, técnico da seleção brasileira de rugby em cadeira de rodas. Ele próprio se aproximou da equipe durante seus estudos na Universidade de Campinas (Unicamp), onde boa parte dos jogadores treina.
Mas nenhum resultado seria possível não fossem os esportistas. Os campeões atuais são particularmente talentosos, afirmam especialistas. “Temos um boom de atletas extraordinários, uma geração muito forte que está dando a resposta”, afirma Parsons, da CBP. Nomes como André Brasil (quatro ouros até a tarde de sexta-feira 14) e a estrela Daniel Dias, fenômenos na natação, encabeçam a lista de premiados. Além do sucesso nas piscinas, atletismo e tênis de mesa estão entre as modalidades de destaque do País no Parapan. Professor de educação física da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), Paulo Brancatti concorda. “Essas pessoas assumem o esporte com mais vontade, determinação e garra. Para muitos é a oportunidade de inserção na vida social.” Para os brasileiros, são garantia de alegria na Paraolimpíada Rio 2016.
Fotos: Jonne Roriz, Daniel Zappe e Marcelo Regua/MPIX/CPB

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