quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Brasil gigante Paraolímpico

 27/08/15
O segredo do primeiro lugar no Parapan 2015 e de bons desempenhos 
em sequência é o de sempre: investimento

Jane Gögel ganhoJane Gögel ganhou medalha de ouro no tiro com arco
Foto: Daniel Zappe / MPIX/CPB

O Brasil pode não viver um grande momento, mas o Parabrasil está com tudo.
 É superpotência. Voltou do Parapan de Toronto, encerrado há uma semana, 
não só na condição de campeão no quadro geral de medalhas, mas com
 mais ouros do que o segundo e o terceiro colocados juntos – no caso, 
os poderosos Canadá e Estados Unidos. Na bagagem, os brasileiros
 trouxeram 90 quilos em medalhas, 257 no total, quase uma para 
cada integrante da delegação de 272 atletas. Não houve uma 
mísera modalidade em que o Parabrasil não tenha subido ao pódio.

A razão para o sucesso do paradesporto nacional é simples: dinheiro. 
Toda vez que um brasileiro deposita na Mega Sena, na Quina ou 
em qualquer outra loteria federal as suas esperanças de levar uma 
vida de marajá, os cofres do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB)
 incham um pouquinho. Desde 2001, com a aprovação da Lei 
Agnelo/Piva, 2% da arrecadação das loterias são direcionados
 ao esporte. Do montante, 85% seguem para o Comitê Olímpico 
Brasileiro. Os demais 15% ficam com o CPB. Até 2014, 
já haviam sido repassados ao paradesporto mais de R$ 250 milhões.
 Antes da lei, o Brasil arrematava uma média de 2,75 ouros a
 cada paralimpíada. Depois, passou para 17.

– O esporte paralímpico era completamente amador.
 A partir da lei, se organizou e consolidou. Os resultados 
começaram a aparecer. Não é qualquer país que tem, hoje, uma
 estrutura como a nossa, com recursos garantidos. É até um paradoxo.
 No Brasil, onde falta investimento para tudo, o paralímpico vai bem –
 comenta o advogado Luiz Cláudio Portinho Dias, 
presidente da ONG RS Paradesporto.

A Lei Agnelo/Piva representa a principal fonte de recursos do CPB,
 mas não a única. Rendeu no ano passado R$ 39 milhões, de 
um orçamento total de R$ 82 milhões. O excedente vem principalmente
 de um patrocínio da Caixa (média de R$ 30 milhões ao ano), 
mas também graças a repasses do Ministério do Esporte e de
 convênios com o governo de São Paulo e a prefeitura do Rio.
 Segundo o presidente do comitê, Andrew Parsons, isso
 coloca o Brasil em um patamar de investimento próximo ao
 das principais potência paralímpicas – China, Grã-Bretanha,
 Rússia, Austrália, Ucrânia e EUA.

Obviamente, o vil metal só se transformou em ouro, prata 
e bronze porque foi bem aplicado. Hoje, o país mantém um
 alentado calendário de campeonatos regionais e nacionais 
em todas as 22 modalidades paralímpicas. A bonança também serviu
 para financiar os Jogos Paralímpicos Escolares, que na última edição
 reuniram 1,2 mil crianças e adolescentes que haviam se destacado
 nas seletivas estaduais. Maior do mundo, essa estrutura permite
 garimpar talentos precoces, caso do paraense Alan Fonteles, 
descoberto aos 14 anos, trabalhado pelo CPB e hoje colecionador de 
ouros e recordes mundiais em provas de 100m e 200m. Em 2012,
 virou notícia ao vencer o então badalado paratleta – hoje homicida
 condenado – Oscar Pistorius nos Jogos de Pequim.

Dinheiro direto para os atletas também faz parte da equação. 
Quem conquista as primeiras posições em competições nacionais 
ou internacionais ganha direito a uma bolsa, concedida pelo governo.
 No Parapan, 96,8% das medalhas foram obtidas por bolsistas. 
Em muitos casos, os valores são modestos, mas a bolsa-pódio,
 direcionada a quem tem maior potencial, pode chegar a R$ 15 mil por mês.

Essa receita permite a muitos paratletas dedicar-se ao esporte em tempo
 integral. A halterofilista Marcia Menezes, por exemplo, dividia-se 
entre a modalidade e dois empregos. Obteve uma bolsa e passou a 
dedicar-se exclusivamente ao levantamento de pesos. No ano passado,
 conquistou o bronze no campeonato mundial.

Segundo Felipe Jacovazzo, diretor-técnico da Associação Nacional de Desporto para Deficientes, um dos efeitos das bolsas é estimular o alto rendimento:

– As bolsas são a grande fonte de renda de boa parte dos atletas. 
Como a renovação é anual, o atleta tem de estar sempre na melhor
 performance, porque é o resultado que vai manter a bolsa dele.

É claro que há algumas questões complicadas. Para Portinho Dias, 
a dificuldade que a pessoa com deficiência encontra para ingressar
 no mercado transformou o paradesporto em opção de segurança
 financeira – o que não ocorreria em outros países, onde há mais 
oportunidades profissionais e acadêmicas. Ele diz que, no Brasil,
 virar paratleta é quase como ser funcionário público.

Há ainda a grande quantidade de deficientes no Brasil, 
população estimada em 30 milhões. Andrew Parsons, presidente 
do CPB, afirma que não há correlação entre esse aspecto 
demográfico e o sucesso do paradesporto de um determinado
 país. Mas o perfil do paratleta brasileiro apresenta particularidades
 tipicamente verde-amarelas. Dos 272 integrantes da delegação
 enviada a Toronto, 43 eram vítimas da carnificina no trânsito. 
Outros 34 adquiriram a deficiência como decorrência de
problemas na gestação ou no parto, outra fragilidade nacional.
 Há ainda as vítimas da criminalidade e da violência que grassam no país.

– O Brasil é um dos países com mais pessoas com deficiência. 
Há muito jovens acidentados de trânsito ou vítimas de armas
 de fogo. São paradoxos que o esporte paralímpico acaba
suscitando. No fundo da questão, se for analisar, vai ver que 
o sucesso do esporte paralímpico é proporcional a várias mazelas
 do país – acredita Portinho Dias.

Tiago Paulino na prova de arremesso de disco


Mais dinheiro à vista

Se financiamento se traduz em medalhas, o Brasil pode 
esperar resultados ainda melhores no paradesporto. 
A legislação que prevê repasse de valores das loterias foi 
alterada para beneficiar o setor. Em lugar de 2%, 2,7% 
da arrecadação será destinada ao esporte. O acréscimo será 
destinado integralmente ao Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB). 
A previsão é que o repasse pule de R$ 39 milhões ao ano para R$ 130 milhões.



Fonte: Zero Hora

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