Em 2014, Anvisa reabriu a discussão sobre o uso de uma das substâncias derivadas da maconha
O ano de 2014 foi importante e trouxe esperança para as pessoas que sofrem com convulsões. A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) reabriu a discussão sobre o uso medicinal do canabidiol, uma das substâncias derivadas da maconha, utilizado em casos de doenças graves e síndromes raras. Isso só aconteceu graças a família Fischer que conseguiu pela primeira vez uma liminar na Justiça para importar e utilizar o medicamento.
Em abril, o casal Katiele e Norberto Fischer pôde usar legalmente o canabidiol para tratar as fortes crises epiléticas que a filha Anny, cinco anos, tinha a cada duas horas, e que a expunham ao risco de morte todos os dias. Como a substância ainda é proibida no Brasil, ocasal “contrabandeou” o produto por seis meses, conta Katiele.
— Basta um sorriso conquistado das nossas crianças para justificar qualquer esforço necessário na autorização e compra do produto. A vida delas vale mais que o preconceito, a lentidão e a burocracia atual da Anvisa.
A pequena Anny é portadora da rara síndrome CDKL5 — que causa comprometimento grave do desenvolvimento neurológico — e começou a apresentar sintomas, como convulsão, já aos 45 dias de vida. Seus pais tentaram todos os tipos de tratamento até decidirem, finalmente, recorrer à tentativa com o canabidiol.
A luta dessa família ficou conhecida em todo o País e retomou a discussão sobre a reclassificação dos produtos à base do canabidiol. No entanto, a Anvisa ainda não tem prazo para discutir a liberação do uso medicinal da maconha. Enquanto isso, pais de crianças que usam o remédio dependem da justiça e cobram regras mais simples para a importação do remédio.
No último levantamento feito pela Anvisa em dezembro, dos 297 pedidos encaminhados à agência, 238 já foram autorizados, 17 aguardam o cumprimento de exigência pelos interessados e 34 estão em análise pela área técnica. O prazo médio das liberações é de uma semana.
O conselheiro Emmanuel Fortes, do CFM (Conselho Federal de Medicina), enumera alguns dos motivos que ainda travam a reclassificação do canabidiol no Brasil.
— Embora já tenhamos visto situações dramáticas sendo resolvidas, com evidências promissoras, há uma série de nuances técnicas que precisam ser esclarecidas. Como, por exemplo, as doses mínima e máxima, dose tóxica, efeitos adversos, interações medicamentosas, quais as patologias que respondem, quais não respondem. Precisamos saber com precisão o que é eficiente.
O psiquiatra José Alexandre de Souza Crippa, professor do Departamento de Neuropsiquiatria da USP (Universidade de São Paulo) de Ribeirão Preto, faz parte de um grupo de estudos que investiga o canabidiol desde a década de 70. Segundo ele, os principais benefícios do medicamento estão relacionados à epilepsia, doença caracterizada por ataques epiléticos e que, de acordo com dados da Opas (Organização Pan-Americana de Saúde), atinge 70 milhões de pessoas no mundo.
No entanto, conforme salientou em entrevista ao R7 em agosto, as pesquisas conduzidas pelos médicos dão pistas de que o remédio também pode ajudar a amenizar sintomas de outros males.
Em países como Estados Unidos, Alemanha, Canadá, Reino Unido, Holanda, França, Espanha, Itália, Suíça, Israel e Austrália, o uso do medicamento é liberado com receita médica ou laudo que justifique a prescrição.
Entre as vantagens compreendidas com uma reclassificação do medicamento, de acordo com Crippa, estão a facilidade de importação, manuseio e a possibilidade de se fazer pesquisas com uma substância que não seja proibida.
Um resultado positivo nas votações do CFM e Anvisa também colocaria um ponto-final, por exemplo, em casos de famílias que, ao esbarrar na burocracia atual, acabam apelando para a importação ilegal da medicação, como aconteceu com a família Fischer.
Primeiro passo
Uma resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina) deste mês, que já está em vigor, autoriza os médicos de todo o Brasil a prescrever o canabidiol. De acordo com o a resolução recomenda a receita apenas para crianças e adolescentes portadores de epilepsias refratárias a tratamentos convencionais
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